2 de abril de 2010

Viver como um monstro ou morrer como um homem bom?

A questão introduzida pelo título teria uma óbvia resposta se não passasse pela representação do que é verdade ou mentira. Saber que a realidade a qual vivemos não passa de uma criação de uma mente insana pode ser a maior verdade que tenhamos a contemplar, a nãe ser pela própria realidade que nos cerca. Num jogo entre o que se pensa que é e o que é realmente, uma palavra introduzida ou um pensamento inequívoco dão graça ao movimento de qualquer pessoa.
Ontem, fomos ao cinema ver Shutter Island. Fora traduzido para o português como A ilha do medo. Como não sou muito chegado em filmes que suscitem reações de pavor já nas cadeiras do cinema, inicialmente refuguei. Ao ler a sinopse e ser incentivado pela minha enfermeira psiquiátrica, resolvi encará-lo. Mostra-se uma ilha, em que se trata de pessoas com desvios psíquicos, numa época pós-guerra de explosão de avnaços científicos sobre a psiquê humana. Isolados, médicos, enfermeiras, técnicos e pacientes vivem numa redoma de segurança, que só é afetada pelas forças da natureza. O enredo se desenrola sobre a figura de Teddy - ou Andrew -, policial federal - ou doente - que busca saber o que há num antigo farol, após várias peripécias pela ilha.
Antes que alguns leitores reclamem de que contei o enredo e o final, pararei por aqui. A questão que me deixou bastante perplexo foi essa: viver como um monstro ou morrer como um homem bom? Ou seja, viver com a vida criada ou com a realidade exposta? Mais: ser aquilo no que me formei pelos percalços da vida real ou voltar a si, encarando a realidade de frente? O questionário pode se fragmentar e se multiplicar, mas o anseio pela resposta não se prende à personagem que manifesta a pergunta. Joga-se para o público, uma vez que não se alimentam maiores ideias. A isso estabelece-se uma relação de causa e efeito: ser o comum é não viver o incomum adiante? Quem sabe viver o incomum seria o prenúncio de encontrar o real adiante? Abrindo-se mais possibilidade de questões, mais o que pensarmos teremos. Afinal, como já diria uma certa propaganda, "o que move o mundo não são as respostas, mas as perguntas".
Essa ideia também suscita a situação dos enfermos. Pessoas que vivem à base de psicotrópicos, terapias inumeráveis, através de situações traumatizantes às quais foram expostas. Se viver a realidade, para nós, ditos sãos, é estar sub júdice de uma sociedade que preza pelos valores cristãos e ocidentais, o que sobra para quem não consegue construir sua vida através da mesma? Ter o controle sobre suas ações, mesmo que inadaptado ao meio em que vive é uma coisa; outra, é quando não se sabe mais quem realmente se é e se cria a ilusão de um mundo no qual se busca respostas. A partir daí, a figura psiquiátrica toma forma e ação.
A maneira como vemos o mundo independe de nossa situação psicológica. Há fatos e isso não se discute. O problema surge quando não mais identificamos o que é real e o que é absurdo. Andrew Leadees sofreu pela inconsequente busca para destruir seu ego, tendo em vista o crime que cometeu. Partiu para uma busca em que nunca haveria criminosos e juízes. Encontrou apenas a ilusão de um mundo absorto e destruído, no qual lutou apenas para manter-se vivo e não permitir que suas ilusões fossem apagadas. Viveu melhor aquilo que o fazia bem, não aquilo que poderia ver.

Um comentário:

  1. A busca por esta resposta está muito em voga ainda na sociedade médica.
    Até onde ir para dar a 'vida' aos pacientes?
    Não só na psiquiatria, mas em todas especialidades médicas questiona-se o que é melhor: deixar morrer ou tentar 'ressuscitar' um paciente?
    ... ;)

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