Há uns cinco ou seis anos, uma novela estrelada pela então guriazinha Deborah Secco fazia sucesso, falando da entrada de brasileiros nos Estados Unidos em busca de uma vida melhor. Se não me engano, América é da mesma autora de Caminho das Índias e aquela outra que tratava sobre a cultura marroquina, a qual não lembro o nome, Glória Perez. O enredo foi bastante útil para mostrar que a situação sócio-econômica do Brasil até então - já que hoje podemos notar alguns bons fatores de mudança - não era de muitas regalias para o povo de classes menos abastadas.
A obra de Dau Bastos, Clandestinos na América retoma esse tema. É uma obra de 2005, feita a partir da compilação de dados de um atravessador. Conta a história de um homem, professor, não realizado em sua profissão e com ambição quase nula, que perde sua esposa para um colega de maior grau e resolve mudar radicalmente de vida assim que Bóia o convida para participar do seu comércio. O professor passa a ser chamado de El Gringo e entra como uma espécie de guia de viagens até encontrar um "coyote", aquele homem que guiará as pessoas até atravessar a fronteira para entrar nos EUA. Com a perda do coyote, há de contratar novos. Novamente com problemas, ele passa a realizar as travessias. Depois de acumular seu dinheiro, necessário para mudar de vida, retorna em definitivo ao Brasil.
Há diversos detalhes que tornam a narrativa bastante extasiante, como os casos amorosos da personagem principal e a ida de um traficante de renome para o país ianque, contudo o principal é a vasta diferença econômica entre os dois países. Brasil e Estados Unidos são vistos como totalmente antagônicos: um Brasil pobre e carente de oportunidades versus o rico, cheio de possibilidades. Não há o aprofundamento de ambos locais, pois não é o que serve à narrativa: o que interessa é o translado das pessoas. Considera-se, porém, que essa ida é motivada por uma relação especial da vida de cada indivíduo com seu meio. Fala-se de pessoas saídas de Criciuma (SC), Governador Valladares (MG), de certas capitais, mas nenhuma rica ou que vá por mera curiosidade. Há aqueles que vão para conquistar dinheiro, os que querem rever seus parentes há muito distantes, o que quer ver a filha pela última vez antes de sua morte - já que é aidética e não pensa em retornar ao Brasil. No fundo, são todos seguidores de um sonho que não necessariamente trará o objetivo esperado. Houve mortes no caminho. O sonho que se transformou em pesadelo para alguns foi a sorte de outros, assim como já dissera Machado de Assis, em Memórias póstumas de Brás Cubas: "a morte de uns é a felicidade de outros".
Viver entre o sonho e o pesadelo, como a personagem de Deborah Secco na novela, é na verdade a tentativa de se reabilitar perante o mundo, de ver que um sonho deve ser tentado, ainda que a frustração o acompanhe. A narrativa de Dau Bastos ilustra muito mais aspectos positivos para seu personagem, mesmo vivendo diversas situações de risco. Num mundo em que há realidades sociais tão díspares, vale buscar aquilo que se julga o melhor para si.
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