por Michelle Horovits
Segundo Jung, quando um fenômeno psicológico forte acontece na vida de um indivíduo, isto demonstra que um tremendo potencial inconsciente está prestes a emergir, prestes a manifestar-se na consciência. Em certo ponto da história de uma sociedade, uma nova possibilidade surge do inconsciente coletivo. O amor romântico é um desses fenômenos estranhamente bizarros que surgiram na história dos povos ocidentais. Foi algo que esmagou nossa ideia de amor e alterou para sempre nossa visão do mundo.
E com esse começo bárbaro temos as clássicas histórias de amor, receitas de comédia romântica hollywodiana, e os subestimados, mas não menos importantes romances de banca. Com personagens lindas, loiras e estupidamente apaixonadas à moda ocidental, eles espalham a ideia de um amor perfeito, com homens maravilhosos e viris e que duram a eternidade de suas poucas páginas.
Com o batido “No fim eles viveram felizes para sempre”, porque essa é a fórmula que rende milhões de dólares até hoje e que é a base desse império dos romances banca, estes livretos podem ser comprados pela bagatela de R$ 5,00 ou menos em qualquer esquina que se preze e que tenha um jornaleiro.
Devo confessar que grande parte da minha bagagem literária começou com o afanar dos livrinhos que minha mãe escondia tão bem no guarda-roupa. Era Rebeca, Sabrina, Bianca e Jéssica, todas grandes conhecidas. Minha mãe afirmava que eram romances muito pesados para os meus 11 anos, pois descreviam cenas picantes para as moçoilas. A verdade é que a pegação rolava solta entre os condes, princesas e tudo o mais.
Mas o grande segredo para cativar o público (entenda-se mulheres, e 80% na faixa dos 30), era que as cenas eróticas não poderiam ser pornográficas. Tinha que ser como os Emanuele que passavam de madrugada na TV. As cenas de sexo devem ser contadas em detalhes, mas sem apelar para palavras pesadas (entenda-se que pau nunca apareceu naquelas folhas) ou gírias. Afinal é erotismo leve para moças recatadas.
Os primeiros livretos apareceram no Brasil, nas décadas de 40 e 60, e tinham o nome nada preconceituoso de Coleção Biblioteca para Moças. Tratava-se de “literatura cor-de-rosa”, como passou a ser chamada. Se aproveitar do imaginário romântico do mulherio foi infalível, pois de acordo com uma pesquisa do Daily Mirror, os tais romances estão entre os mais vendidos de 2010 entre os livros eletrônicos (e-books) e o Kindle, alcançando 57% de vendas.
Uma das favoritas e mais famosas escritoras desses romances água com açúcar é a inglesa Bárbara Cartland. Lembro que ela apareceu de roupa azul e cara pintada bem velhinha em algum Guiness que eu tinha quando pequena. A escritora vendeu mais de 1 bilhão de cópias e escreveu 723 romances. Entre eles o Valsa Encantada, guardado até hoje entre os clássicos da literatura na estante de casa.
Os enredos são meio batidos; quem quiser conhecer as moças, deixe-me apresentá-las. Os nomes existem para separar categorias. Nos tipos “Sabrina” sempre tem um casal infeliz que supera tudo; sempre se desenrola nos dias de hoje. “Jéssica”: tem tipos mais “calientes”, muitas cenas de amor na praia, em castelos com homens viris e sarados e promessas de amor eterno à luz da lua. “Bianca” é para as mulheres que gostam de sagas na Idade Média e sonham em ser rainhas e princesas; tem o casal que passa milhares de dificuldades para ficar junto, sogras doidas, condes, casamentos, lutas pelo amor da mocinha e tudo o mais que interessa para as fãs românticas.
Aliás, o que realmente importa nesses livretos é que no final o casal tem que viver feliz para sempre após enfrentar muitas dificuldades para conseguir ficar juntos, e que em cada página a leitora possa encontrar as fortes declarações de amor do galã para a mocinha e o lindo casamento no fim. Tem que se passar em lugares exóticos e distantes e ter uma moça bonita e um galã sem camisa na capa em posição de quase beijo. As mais famosas são as capas com Mika Dale. Enfim, o que importa é não existir na vida real, ser barato, fácil e alimentar essa ideia de amor frufru ocidental perfeito, que no fundo no fundo (bem lá no fundo), todas nós adoramos.
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