Antes de ver o Shutter Island, passeávamos pelo Barra Shopping. Além de ter sido perseguido por três alunas e uma comparsa, lanchado no McDonalds e visto uma roupas, fomos à Livraria Saraiva. Lá, no meio de tantos lançamentos, um livro me chamou a atenção: A menina com a lagartixa, de Bernhard Schlink. No final do ano passado, já lera O outro, desse autor. Como já havia gostado, li essa nova obra numa sentada - ou deitada -, na sexta pela manhã.
O enredo é de uma dramaticidade muito sensível. Um menino que mal sabe do trabalho do pai, apesar de frequentar seu escritório; uma mãe que apenas reclamava da vida, após a decadência social. O curioso era a reclamação a respeito de uma certa menina judia. Quando menino, nem sabia o protagonista o que era uma menina judia. Contexto: Alemanhã, início da década de 50. Pai era juiz da região onde moravam, e ajudava os judeus. Fora punido por si próprio ao encaminhar para a morte um companheiro: álcool e posterior morte foram sua solução. A mãe não desenvolvia frases complexas com o marido ou com o filho. No antigo escritório, depois na nova casa e, após a morte do pai, no seu quarto em uma pequena cidade onde estudava, o quadro de René Dallman, A menina com a lagartixa, rondava.
A busca que a personagem principal faz é descobrir a origem daquele quadro que tanto o fascina. O que se descobre no decorrer do texto é que o caminho realizado para tal feito determinará quem realmente é aquela pessoa, o que foram seus pais, quais foram as ações que identificaram quem realmente eram, tanto a si quanto aos parentes. Os judeus aparecem com pouca identidade no início e terminam com real importância. Assim, temos uma obra que não se prende apenas ao que anseia uma personagem, mas a todo um contexto sócio-cultural que ilustra o ser humano como alguém perdido no mundo, que não pode buscar algo mais senão através da busca por seus reais valores. Numa certa altura da obra, o então menino resolve que quer conquistar uma bela garota - mas nem paixão sente por ela. Não houve ainda a identificação do que é amor ou paixão. Quando concretiza o objetivo, ela nada mais é que nada, trazendo enojamento ao rapaz, que a deixa partir após sua primeira noite amorosa. Ele só conseguirá se reconhecer após dar um destino ao quadro, que o perseguia pela incessante vontade de saber quem realmente era.
Vale lembrar que as obras de Schlink giram sobre o eixo da identidade. Em O leitor, o guri que lia os livros para a mulher mais velha também não sabia quem realmente era, até a punição que a mesma recebe por seu crime de guerra, no julgamento de Nuremberg; em O outro, o marido segue atrás de um amante da finada mulher para conseguir identificar o que foi a relação de ambos pelos anos que sucederam; por fim, em A menina com a lagartixa, o envolvimento da personagem se dá através da identificação de soluções para sua vida. Falando em vida, é esse o caminho que trilhamos pelo tempo que temos: reconhecer quem somos para partirmos em busca de nossos ideais.
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